Há pouco mais de um ano, apareceu uma gatinha em meu quintal. Eu nunca tivera gatos, somente cães a minha vida toda. Deixei-a na minha garagem, enquanto procurava por um possível interessado em ficar com ela, mas ele nunca apareceu. E ela foi ficando, ficando e ficou.

Estranhei, desde o início, o jeito de um gato, sua autossuficiência, seu olhar de altivez, sua calma, enquanto tudo à volta pode estar fervendo. E um dos comportamentos que até hoje me faz sofrer é a liberdade de ir e vir que o gato possui. Ela sai e volta quando quiser, bem como fica na rua o tempo que for, o qual nunca é uniforme.

Dias atrás, ela saiu de manhãzinha e não voltou o dia todo. Cheguei do trabalho e ela não aparecera desde a manhã daquele dia, o que me deixou nervoso – ela nunca ficara mais de duas horas na rua. Coloquei sua foto no Facebook, numa página de proteção aos animais aqui de minha cidade, totalmente desolado. Saí a pé, de carro, pelas redondezas, à sua procura, e nada. Somente lá pelas nove da noite, ela apareceu, como se nada tivesse acontecido, e foi comer sua ração calmamente.

Minha gata está me ensinando muita coisa, principalmente em se tratando de relacionamentos e amor. Ela me ama e deixa claro isso quando dorme sob minha barriga, quando se esfrega em forma de um oito entre minhas pernas enquanto escovo os dentes, quando lambe minha mão com sua língua crespa. Ela me ama e sempre volta: ela quer que eu entenda que ela vai voltar para mim. Todo dia. Ela vai voltar.

Aprendo, a cada dia, que amor é o que faz a gente retornar, por mais que a gente se ausente, por mais que o tempo passe, por mais que demore essa volta. O amor é livre, o amor passeia por aí e nem por isso deixa de ser fiel. O amor requer qualidade e não quantidade. Amor é laço que não aperta. É confiança no outro, enquanto ele está longe de nossos olhos.

Agora mesmo, ela está passeando pelas ruas, há horas, enquanto fico com o coração apertadinho a esperando. Ainda não adquiri a confiança que ela requer, porque meu amor ainda é egoísta e humano. Talvez eu nunca chegue a desenvolver esse desprendimento em relação a quem amo. Mesmo assim, minha gata não desiste de me provar que amor é confiança, é tranquilidade, é confiar no quanto o outro nos ama, mesmo não deixando de ser quem é.

O amor não desiste, por isso ela sempre sai, apesar de me deixar intranquilo, porque ela quer me provar que não desistirá nunca de mim. Nunca.

*Alguns dias depois de ter escrito este texto, minha Kate se foi desta vida. Mas voltou, voltou ao meu coração, pois ela nunca saiu nem nunca sairá de dentro de mim. A dor também ensina.

Imagem: Djordje Novakov